Louco
Louco
Paulo Camelo - Cajueiro, tu tens olhos? Podes dizer o que viste? - Vi um casal se amar e na sombra dos meus galhos desse mundo se isolar. - E tu, coqueiro, escutas? Diz-me, então, o que ouviste. - Daqui nada pude ouvir; eu não sei de que tu falas pois nada pude escutar. - E tu, aqui nos meus pés, o que sentiste, capim? - Algo nunca imaginado: um casal aqui deitou e eu não fui nem tocado. - Aqui choveu nesse dia; a chuva nada notou? - Eu caí sobre o coqueiro, eu molhei o cajueiro, sobre o capim me deitei mas o casal não molhei, eu não o vi, não, senhor. - Mas o vento está lembrado do casal aqui deitado? - Eu balancei o coqueiro, agitei o cajueiro, o pó do capim varri mas no casal não toquei, esse casal eu não vi. - Mas então esse casal só o cajueiro viu? O coqueiro não ouviu, o capim não o sentiu, a chuva não o molhou nem mesmo o vento o tocou? Será que houve o casal, ou só houve o pensamento, a intenção do momento que, não sei como diabos, o cajueiro notou? Será que foi ilusão também do capim no chão? É um mistério esquisito, não sei em quem acredito, não sei a quem perguntar. Ou será que nisso tudo quem está louco sou eu?
Paulo Camelo
Enviado por Paulo Camelo em 02/05/2005
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