Paulo Camelo

Poesia é sentimento. O resto é momento.

Textos


Discurso de posse na Abrames

Senhores da Abrames, amigos que eu tenho
e que ainda terei, pois agora também
eu me torno abramista, na vaga de quem
já me fez seu amigo e é de lá donde venho,
do meu Pernambuco, e que é homem de engenho
e de arte, saber e cultura sem par,
a quem presto louvor – me permitam falar –,
Doutor Meraldo Zisman, que ocupa a cadeira
quarenta e a quem hoje sucedo, e Deus queira
que eu traga a esse Rio o Recife e seu mar.

Meraldo é um homem que estuda o Nordeste,
nas crônicas fortes que sabe fazer.
Também nos ensaios se vê seu poder,
e nesse mister ele logo se investe
a falar de violência, esse cabra da peste
que faz da caneta uma arma sem par.
Sem meias palavras, se mostra exemplar
também a lutar contra a desnutrição,
um tema que aborda há mais tempo e que não
descansa, sequer, como as ondas do mar.

Mas sei que Meraldo não foi fundador
da cadeira quarenta. Também o Nordeste
deu outro doutor, outro cabra da peste
que fez Paulo Afonso tornar-se esplendor.
Teixeira Barbosa exerceu com amor
e dedicação um mandato invulgar,
prefeito que fez a cidade mudar,
com saneamento e urbanização,
jamais se esquecendo da educação,
e hoje é nome de rua, na beira do mar.

Falemos também com louvor do patrono
Adroaldo Soares de Albergaria.
Também do Nordeste, também da Bahia,
também um político, sábio e humano.
Poeta, ensaísta, traçou o seu plano
de ação na tribuna, onde foi exemplar
no conhecimento que fez divulgar.
Não era político e médico apenas
e nos seus poemas, que fez às dezenas,
marcou o seu nome na beira do mar.

Meraldo, que passa a cadeira pra quem
no momento vos fala, hoje torna-se emérito,
título nobre que assume por mérito,
por sapiência e cultura, também.
E quem o sucede não sabe se tem
sequer competência pra nela assentar.
Permitam, porém, que aqui possa eu falar
um pouco de mim, o que sou, o que faço,
antes que na quarenta eu descanse o meu braço
e feliz ouça o som que me chega do mar,

o mar que no meu Pernambuco eu conheço
das cálidas águas, das quentes areias,
das praias que temos também a mancheias,
por onde o Brasil teve um dia o começo
no Cabo de Santo Agostinho, e hoje eu teço
essa minha oração, traço o meu palpitar
de poeta intimista e – quem sabe? – mostrar
nesses versos que trago, com ritmo forte,
o que faço, o que escrevo e, com pouco de sorte,
traduza o meu íntimo, mostre o meu mar.

Eu sou recifense da gema. O que escrevo
é porém diferente das loas que eu teço
ao Recife que eu amo e que desde o começo
do meu palpitar me desdobro em enlevo.
No passo eu me embalo ao ouvir qualquer frevo,
pois é do meu sangue o prazer de frevar.
No baque do maracatu sei dançar,
também na quadrilha e no coco eu me empenho,
não vejo cansaço, vergonha eu não tenho
dançando ciranda na beira do mar.

Se sou sonetista – perguntam vocês –,
respondo que sim, pois eu sinto o soneto
tomar meu espírito, quando eu me meto
a escrever, e a poesia me toma de vez
o falar, o pensar, e me vejo, talvez,
a dizer coisas simples no meu versejar
e sentir que são belas canções. E esse ar
que respiro de leve e me enche os pulmões
transforma-se logo em mais inspirações,
e eu faço sonetos, e eu canto o meu mar.

Senhoras, senhores, amigos, aqui
espero que eu tenha cumprido a missão.
Aceitem do fundo do meu coração
desculpas por tanto que eu quis e esqueci,
pois nunca fui bom na oratória. E, se eu li,
é que essa memória costuma falhar.
Até meus sonetos não sei declamar
sem ter um papel em que eu ponha a visão.
Termino, portanto, essa minha oração
cantada um galope na beira do mar.
Paulo Camelo
Enviado por Paulo Camelo em 30/11/2012


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